Brasília, quarta-feira, 8 de junho de 2016 - 8:38
RETROCESSO SOCIAL
Marcos Verlaine: A correlação de forças inverteu-se, prepare-se!
Fonte: Diap
‘Sem um trabalho intenso de resistência, denúncia e contestação à ofensiva do novo governo sobre direitos dos assalariados, conforme preconizado na ‘Ponte para o futuro’, há risco real de retrocesso nas conquistas sociais’.
Depois de três mandatos sob o lulismo, a correlação de forças políticas e sociais mudou bruscamente. O abreviado segundo mandato de Dilma, que começou em janeiro de 2015, iniciou-se sob o signo dessa inversão, já que ela se elegeu com uma agenda e governou com outra, até ser afastada em 12 de maio. Mais claramente, a presidente governou com a agenda dos que perderam em 2014.
O segundo mandato, todos se lembram, começou com o envio ao Congresso, por Dilma, das medidas provisórias (664 e 665, de 2015) que retiraram direitos dos trabalhadores. A primeira alterou as regras para o recebimento do auxílio-doença e da pensão por morte, impondo carências e tempo de recebimento conforme a faixa de idade do beneficiário. A segunda endureceu as regras para a concessão do seguro-desemprego, do seguro-defeso e do abono salarial.
Na época, quem pilotou essas modificações foram o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o vice-presidente Michel Temer, que atuou no Congresso para aprová-las. A imensa maioria conservadora no Legislativo impôs ao governo tortuosas e demoradas negociações para aprová-las, mesmo concordando com o conteúdo.
Essa inversão evidenciou-se a partir da eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara, que em sua atuação como líder do partido já dera demonstrações que sua relação com o Planalto, sob Dilma, não seria de parceiro. Eleito comandante da Mesa Diretora da Casa, dificultou o quanto quis e pôde a vida do governo em todas as votações de interesse do Planalto, a começar pela sua eleição, que bateu o candidato do governo no primeiro turno.
A base de Dilma era grande, mas gelatinosa e inconsistente. Apoio consistente só tinha mesmo do PT, PCdoB e PDT. A votação do impeachment demonstrou isto.
A numerosa e consistente base de Temer no Congresso Nacional — Câmara e Senado — vai do centro à direita, excluindo a esquerda.
Marcha ré
Guindado à Presidência, o interino Michel Temer (PMDB) lidera um governo liberal-conservador, com uma base parlamentar que representa majoritariamente os interesses do capital e do mercado.
Para compreender essa correlação de forças políticas no Congresso basta ter em mente os números de duas bancadas informais: a empresarial e a evangélica. A bancada empresarial elegeu para a atual legislatura, entre novos e reeleitos, 251 congressistas, sendo 221 na Câmara e 30 no Senado.
A bancada do mercado, nas últimas três legislaturas nunca esteve abaixo de duas centenas. ´Na Legislatura 2011-2015, os representantes patronais contaram com 273 congressistas, sendo 246 deputados e 27 senadores. A nova composição conta com semelhanças numéricas comparativamente à Legislatura 2007-2011, quando a bancada empresarial reunia 219 parlamentares´, identificou a Radiografia do Novo Congresso – Legislatura 2015-2019, publicada pelo Diap.
A bancada evangélica, que é conservadora e chancela a agenda empresarial, elegeu 75 deputados em 2014.
Sob Lula, o Congresso conservador até tentou imprimir uma agenda liderada pela sempre numerosa bancada empresarial. Sempre que possível tentava emplacar, aqui e acolá, propostas para mitigar direitos. Mas a onda progressista que se espraiou pela América Latina, sob a liderança do Brasil, não permitiu retrocessos.
Agora mudou. A correlação de forças inverteu-se! Sempre à espreita e renitente em relação às mudanças, a direita e os setores conservadores, sob Michel Temer, querem avançar sobre os direitos dos trabalhadores. O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, em entrevista para Folha de S.Paulo, no dia 6 de maio, disse textualmente que ´queremos até o fim do ano ter uma reforma trabalhista´. Isto é, vai esperar passar as eleições municipais para enviar ao Congresso uma proposta nessa direção.
Ao ser indagado sobre o que pode ser modificado, Padilha afirmou que o ´acordado sobre o legislado´, por exemplo. ´A reforma é feita para assegurar as garantias do trabalhador e gerar emprego´, disse ele. Para contornar a crise econômica, o governo pretende investir contra os direitos, sob o falso dilema que o custo da mão de obra no Brasil é alto.
A Associação dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) desconstrói essa falsificação. ´Tomando por base o salário mínimo, o mercado de trabalho brasileiro registra um salário-hora da ordem de [apenas] R$ 4, enquanto nos EUA paga-se pela mesma hora mínima, o equivalente a R$ 23,31; na Alemanha R$ 25,16; na Espanha R$ 17,50; e, em Portugal, R$ 15,40´, exemplifica.
A mudança desejada segue orientação do mercado, que intenta flexibilizar direitos para maximizar os lucros e resultados das empresas, com custo mínimo possível.
Que fazer
O governo anuncia aos quatro cantos que pretende reformar a Previdência e alterar a legislação trabalhista. Algumas centrais até já tiveram reunião no Planalto para debater estes temas, com acerto para voltar à mesa de discussão em 30 dias.
É sabido que Temer não terá muitos obstáculos para encaminhar a agenda regressiva. Em artigo intitulado ´Governo Temer não fugirá de agenda impopular´, Antônio Queiroz, do Diap, já diagnosticou que, pelo perfil dos que agora comandam a República, ´A equipe do presidente interino Michel Temer, a começar pelo próprio, não terá dificuldades para encampar medidas impopulares, inclusive pelo histórico de comportamento de alguns dos membros do novo governo.´
Para evitar serem pegos de surpresa, os movimentos sindical e sociais precisam se preparar para resistir e enfrentar a batalha que se avizinha.
Para isso — os trabalhadores públicos e do setor privado, aposentados e pensionistas — ´irão precisar de organização, mobilização, unidade de ação e aliança com outras forças contrárias a essa agenda conservadora e neoliberal´, pontifica Queiroz em seu artigo.
E acrescenta: ´Sem um trabalho intenso de resistência, denúncia e contestação à ofensiva do novo governo sobre direitos dos assalariados, conforme preconizado na ´Ponte para o futuro´, há risco real de retrocesso nas conquistas sociais´. Mãos à obra!
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