Igualdade salarial: lei federal completa 1 ano sob ameaça de ser suspensa

Brasília-DF, quarta-feira, 27 de novembro de 2024


Brasília, quarta-feira, 24 de julho de 2024 - 14:38      |      Atualizado em: 30 de julho de 2024 - 10:36

Igualdade salarial: lei federal completa 1 ano sob ameaça de ser suspensa

Projeto de Decreto apresentado à Câmara dos Deputados propõe suspensão de normas que regulamentam a aplicação da Lei 14.611/23

Tânia Rêgo/ Agência Brasil

Neste mês, a Lei 14.611/23 — Lei da Igualdade Salarial — completou 1 ano de vigência no Brasil. Nesse período, tem exercido função crucial na luta pela equidade de gênero no mercado de trabalho, com objetivo de eliminar a disparidade salarial entre homens e mulheres que exercem a mesma atividade ou função. 

Apesar da relevância social e econômica, o PDL (Projeto de Decreto Legislativo) 169/24 apresentado em abril, na Câmara dos Deputados, propõe a suspensão da regulamentação da lei.

De autoria da deputada federal Adriana Ventura (Novo-SP), o texto será analisado pelas comissões de Trabalho; Defesa dos Direitos da Mulher; e de Constituição e Justiça. Em seguida, será votado em plenário, antes de ser encaminhado para apreciação do Senado Federal — Casa revisora.

Na justificativa, a parlamentar alega que as normativas que regulamentam a lei — Decreto 11.795/23 e Portaria MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) — estariam impondo obrigações ao empregador que não estavam previstas na norma em si, além de promover possível violação de anonimato dos trabalhadores.

Relatório de Transparência e Critérios Remuneratórios
Adriana Ventura refere-se à exigência de publicar Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios produzido pelo MTE. Medida que, segundo a deputada, não teria “prazo para adaptação ou correção de eventual desequilíbrio, ou mesmo para sistematizar o processo de levantamento, organização e transmissão de tais informações”, afirma.

Para o SAEP, a possibilidade de suspensão das normas regulamentadoras é ameaça à própria Lei da Igualdade Salarial. Iniciativa que representa retrocesso em aspectos legais e protetivos do direito constitucional de tratamento igual entre homens e mulheres.

A equidade salarial ainda é desafio no Brasil, onde a força laboral feminina ainda é subvalorizada, se comparada com a dos homens. Dar transparência às remunerações e critérios de contratações e promoções é tratar a questão com clareza e honestidade necessários, além de promover ambiente organizacional mais inclusivo e equilibrado.

Equilíbrio e igualdade
A Lei da Igualdade Salarial é passo significativo para promoção da igualdade de gênero no mercado de trabalho. A lei alterou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e estabeleceu regras claras para que empregadores remunerem, sem distinção homens e mulheres que exerçam funções idênticas. Para isso, previu critérios garantidores da igualdade:

•    mecanismos de transparência salarial e critérios remuneratórios pelo empregador;

•    maior fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios;

•    canais para denúncias;

•    programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho;e

•    fomento à capacitação e à formação de mulheres.

Além disso, a norma determina que empregadores com 100 ou mais empregados publiquem a cada semestre relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, observada a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).

Na hipótese de haver desigualdade identificada a partir dos relatórios, a empresa deve apresentar e implementar plano de mitigação, com metas e prazos. E, em caso de descumprimento das diretrizes previstas, a lei prevê a aplicação de multa administrativa de até 3% da folha de salários, limitada a 100 salários mínimos.

19,4% a menos
Informações referentes a 2022, preenchidas por 49.587 empresas no eSocial, foram consolidadas em documento, divulgado pelo MTE em março deste ano. O 1º Relatório Nacional de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios aponta que as trabalhadoras ganham 19,4% a menos que os trabalhadores no Brasil.

Diferença essa que se acentua quando as remunerações são avaliadas por grupos ocupacionais. Entre dirigentes e gerentes, a disparidade chega a 25,2%. 

Mulheres negras
Mas as mulheres negras são as que mais sentem os prejuízos dos preconceitos de gênero e de raça/cor somados. Com apenas 16,9% da força de trabalho, são as que têm renda mais desigual. A remuneração, que soma salário e benefícios, registrou a média de R$ 3.040,89 — o que equivale a 68% da remuneração média de homens não-negros (R$ 5.718,40) e 66,7% da de mulheres não-negras.

Quando apurado apenas o salário médio de contratação das mulheres negras, o valor registrado em média pelas empresas foi de R$ 1.566. Cifra que corresponde a 82% da média dos salários iniciais, na faixa dos R$ 1.901.

Enquanto 51,6% dos empregadores apresentaram planos de cargos e salários ou plano de carreira, apenas 32,6% atestaram possuir políticas de incentivo à contratação de mulheres. Só 38,3% adotaram políticas para ascensão profissional para cargos de direção e gerência.

Força nos lares
Desde 1970 e 1980, a participação feminina no mercado de trabalho vem aumentando. Mas, em País como o Brasil,  de desigualdades acentuadas, a remuneração de mulheres entra na lista de disparidades. 

O impacto atinge em cheio a sociedade, já que, entre os anos de 2021 e 2022, 72,9% das mulheres chefiavam seus lares, segundo a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua). 

O percentual apurado em 2022 representa 38,3 milhões de mulheres à frente de todos os cuidados com a casa e a família. Dessas, 11,25 milhões eram mães solo. Já entre os homens 1,76 milhão de pais solo eram responsáveis pelo lar.

No período, dados da Pnad Contínua apontaram que essas mulheres estão mais suscetíveis ao desemprego. Entre mães solteiras a taxa foi de 7,3%. Entre mães casadas a taxa foi de 4,4%, enquanto pais casados registraram desemprego de 3,2% e pais solo 3,4%. Os índices apontaram também que 29,4% das mães solo estão fora da força de trabalho, contra 7,8% de pais casados e 37,6% das mães casadas na mesma condição.

Entre os que se encontravam empregados, a remuneração de mães solo chegava, em média, a R$ 2.105 por mês, 38,8% a menos que pais casados ou solo, que recebiam R$ 3.440, e 19,8% a menos que mães casadas, com R$ 2.626 de salário.

Debate inclusivo
A apresentação de proposta que suspenda a Lei da Igualdade Salarial indica a necessidade de ampliar o debate sobre esse problema, já que apenas metade dos empregadores se adequaram à norma.

O SAEP entende a importância de aprimoramentos legislativos constantes, mas observa com preocupação e precaução qualquer ameaça às conquistas tão significativas para aas trabalhadoras. 

Por isso, o Sindicato defende que alterações sejam construídas sempre ouvindo-se a sociedade como um todo, empresas, empregados e entidades representativas, na construção de contexto jurídico-legal mais justo e inclusivo.









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