A implementação do ensino de história e cultura afro-brasileira

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Brasília, sexta-feira, 2 de janeiro de 2009 - 17:36

ARTIGO

A implementação do ensino de história e cultura afro-brasileira


Por: Maria Lúcia de Santana Braga

Em novembro passado, a Folha de S.Paulo publicou caderno especial sobre o racismo e o preconceito racial no Brasil. Dois pontos na cronologia sobre as conquistas da população negra apresentada pela Folha chamaram a atenção dos leitores mais avisados.

 

O primeiro destaca, no ano de 2004, a criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad), no âmbito da estrutura do Ministério da Educação, responsável pelas diversas ações voltadas para a educação das relações étnico-raciais. O segundo ponto refere-se à ausência da Lei 10.639 em 2003, somente mencionada no ano de 2008, quando a Folha ressalta que o governo pretende "colocar em prática o ensino de história e cultura afro-brasileira" nos sistemas de ensino do país.

 

Esse último ponto constitui obviamente um tipo de equívoco bastante comum, que pode ser constatado em matérias publicadas no mesmo período. Na própria Folha, no dia 27/10/08, com o título "África Esquecida", afirma-se que, depois de cinco anos e mais de 10 milhões investidos na formação de professores e na produção de material didático, a Lei 10.639/03 "não saiu do papel".

 

Da mesma forma, matéria do Correio Braziliense, de 17/11/2008, assinala que "poucas escolas do País estão cumprindo a Lei que estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana". As iniciativas seriam isoladas e pouco consistentes.

 

A meu ver, o que se coloca é que não temos ainda uma avaliação precisa sobre a implementação da Lei 10.639/03 nos sistemas de ensino. Decorridos mais de cinco anos, desde a alteração da LDB, a necessidade de avaliação e formulação de indicadores de insumo, resultado e impacto das variadas ações voltadas para a efetivação da história e cultura afro-brasileira é cada vez mais premente.

 

Freqüentemente, são feitas avaliações apressadas e sem o devido cuidado. Antes de mais nada, é preciso lembrar que o processo de implementação de qualquer texto legal é complexo e exige a colaboração e articulação de vários níveis de governo e de Estado.

Nesse sistema complexo, o papel do Ministério da Educação, conforme prevê a Constituição de 1988, reside na indução e na orientação das políticas educacionais. É preciso destacar que durante as últimas duas décadas houve uma acentuada descentralização da educação pública no Brasil, com redefinição de competências e atribuições das unidades federadas.

 

A tese da descentralização da educação dominou boa parte do debate nos 1980 e se implantou de forma definitiva a partir dos anos 1990:

 

"Na década de 1990, argumentava-se em defesa da descentralização da política educacional com base no fato de que ela seria um processo gerador de círculos virtuosos. Dito de outro modo, ela otimizaria recursos pela eliminação de atividades-meio; fomentaria uma efetividade maior das políticas, já que transferiria para a ponta dos sistemas, para os beneficiários, a responsabilidade de estabelecer as prioridades a serem atendidas; e tornaria o processo mais transparente, pois permitiria à população local acompanhar e fiscalizar a devida aplicação dos recursos e a prestação dos serviços". (CASTRO  e DUARTE, 2008:9-10)

 

Tudo isso afetou e tornou ainda mais desafiador o processo de implementação de uma política pública como é o caso da temática história e cultura afro-brasileira e africana nos currículos da Educação Básica.

 

Avaliar os resultados da implementação da Lei 10.639/03 nos últimos cinco anos implica em observar diversas variáveis como, por exemplo, a relação multilateral entre o Ministério da Educação, as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação; o papel supletivo e redistributivo do MEC na transferência de recursos aos Estados, Distrito Federal e Municípios; o impacto desses insumos destinados à formação continuada de professores; e a contribuição do Ministério na produção e distribuição de material didático e paradidático.

 

Avaliações ligeiras como as publicadas nos jornais citados apenas enxergam alguns aspectos. É preciso ir mais além e perceber os diferentes planos presentes na organização dos sistemas de ensino brasileiro, com destaque para a fluidez e instabilidade das instituições e dos padrões político-administrativos, conforme lembra Klaus Frey.

 

Enfim, torna-se cada vez mais urgente uma cultura de avaliação e de análise das políticas públicas educacionais que se atente para os diferentes padrões de organização política e administrativa, para a fragmentação das agendas nos diferentes níveis do Estado e para a atuação dos variados atores e seus estilos políticos.

 

(*) Socióloga, Doutora em Sociologia e colaboradora do Diap









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