O impeachment e suas latentes contradições

Brasília-DF, quinta-feira, 28 de março de 2024


Brasília, segunda-feira, 21 de março de 2016 - 13:21      |      Atualizado em: 28 de março de 2016

OPINIÃO

O impeachment e suas latentes contradições


Por: Marcos Verlaine*

Sistema está montado e protegido pelos principais beneficiários do sistema corrupto

reprodução

A crise política nacional se acirrou e suas contradições também. Lula, que sofre pesados ataques políticos e pessoais dos seus adversários e inimigos políticos foi ovacionado na Avenida Paulista, na última sexta (16), e recebido de braços abertos pela massa que o aguardava.


Na mesma Avenida Paulista, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB), no último dia 13, foram escorraçados sob gritos furiosos de ´oportunista´ e ´corrupto´, na manifestação contra o governo e o PT, que ele ajudou a convocar.


Uma grande empresa de comunicação nacional pauta, convoca e dirige uma agenda virulenta contra o governo, com cobertura ao vivo e convocação quase que direta da população para aderir aos protestos. Pauta os partidos de oposição no Congresso e repercute em seguida suas ações, convoca manifestantes para os atos pró-impeachment da presidente Dilma e a cassação e prisão do ex-presidente Lula.


Além disso, busca orientar e dirigir as manifestações, mas não lhes dá voz, pois se assim o fizesse, talvez pudesse subverter os seus interesses políticos. Já que o ódio de parte desses manifestantes poderia ser um suicídio político, pois o povo brasileiro não concorda com a agenda preconceituosa e odiosa dos meios de comunicação, que é seguida e apoiada por esses setores intolerantes da chamada ´classe média´, que tem feito atos contra a presidente da República e pela interrupção de seu mandato.


Se os meios de comunicação no País fossem democratizados haveria uma cobertura, senão isenta, o que seria um mito dos que querem que o povo acredite, mas, mais equilibrada, em que ambos os lados na disputam teriam voz e visibilidade.


A cobertura das manifestações expõe bem essas contradições. Os atos do dia 13 foram transmitidos ao vivo e são apresentadas como se opiniões unânimes fossem. Cientistas políticos, advogados, magistrados e jornalistas que concordam com as premissas que levaram a cabo os protestos são convocados para opinar e emitir juízo de valor obsequioso sobre esses. Além disso, em geral, são superdimensionadas.


Com as manifestações contra o golpe do dia 18 último ocorreu exatamente o oposto. Foram transmitidas por obrigação da pauta, porque não dá para simplesmente ignorar ou fingir que não ocorreram.


Querem ditadura, mas é a democracia que lhes dá liberdade e voz


Vinte e oito anos depois de superada a ditadura militar, que durou 21 anos (1964-1985), a democracia brasileira é ameaçada por estratos sociais que pedem a volta dos militares ao poder, sob o prosaico chamamento de ´intervenção militar constitucional´. A grande maioria dos jovens que hoje saem às ruas pedindo a volta das forças armadas ao poder não conhece e nem procura conhecer o que foram os terríveis anos de regime militar. Naquela época, eram proibidas e violentamente reprimidas as manifestações políticas contrárias ao governo.


Outra esquisitice são as pessoas irem às ruas pedir o ´fim da corrupção´ vestidas com a camisa da seleção brasileira — que é organizada e representada pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), instituição privada sob a qual pesa graves suspeitas e denúncias de corrupção. A seleção brasileira é uma espécie de unanimidade nacional, que sob a ditadura militar, ganhou ares de patriotismo, sobretudo depois da Copa de 70, no México, onde o grupo conquistou o tricampeonato mundial. Essa conquista caiu como ´uma luva´ para a ditadura, que manipulou os brios nacionais contra a oposição ao regime militar.


Os manifestantes contra a corrupção atacam apenas as consequências dessa chaga, mas se recusam a discutir suas causas, incrustadas num sistema montado e protegido por parte dos organizadores desses atos e também beneficiários do sistema corrupto. São parte significativa e dinâmica desses que têm organizado, convocado e financiado essas manifestações contra o governo.


É relevante lembrar que os militares não são, nem nunca foram a reserva moral do País. A corrupção no Brasil teve mais acolhida e proteção exatamente no período do regime militar, cuja imprensa não era livre e as liberdades democráticas não existiam.


Impeachment

O processo foi aberto pelo atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sob o qual pesam graves denúncias. A abertura do processo de impeachment é uma forma de vingança contra a presidente Dilma por não lhe conferir apoio contra pedido e processo aberto na Casa por quebra de decoro parlamentar.


Isto é, contra Dilma não há nenhum crime definido e apurado, não há crime de responsabilidade algum. Porém, como o processo é fundamentalmente político, então a frágil acusação das ´pedaladas fiscais´ serve e tem eco na mídia. A Câmara que pode cassar Dilma em processo célere é a mesma que há meses está às voltas com o processo de Cunha.


Só no Conselho de Ética, o processo contra Cunha levou mais de seis meses para ser apreciado. O parecer pela admissibilidade da representação que pede a cassação do seu mandato, por ´supostamente´ mentir à CPI da Petrobras sobre possuir contas no exterior, foi aprovado por 11 votos contra 10.


Mas, a contradição maior é esse processo ser aceito por Cunha, que é acusado e tem processo aberto no Supremo por envolvimento no mega esquema de corrupção na Petrobras, investigado pela Operação Lava Jato.


Há mais contradição. Parte expressiva dos membros da comissão processante do impeachment — 65 deputados ao todo — tem processo no Supremo e vários na mesma operação que investiga Cunha.


As três últimas para fechar as contradições que envolvem os debates sobre o impeachment. Corre à ´boca miúda´, que se Dilma for cassada e Lula processado, condenado e preso, a Lava Jato acaba, pois já teria cumprido o papel para o qual foi montada, nem que para isso tenham que fritar Aécio Neves para dar uma falsa imagem de imparcialidade.


Pode até ser que em caso de a presidente Dilma ser cassada alguns segmentos da economia melhorem. Mas, não para os trabalhadores, cujos direitos e conquistas serão negociados no Congresso — com possibilidade de flexibilizar ou até retirá-los — sem nenhuma cerimônia. Haja vista que os grupos que querem se ver livres do PT são os mesmos que dia sim e o outro também atuam para mitigar os direitos dos assalariados.

Os manifestantes pró-impeachment e contra a "corrupção" não sabem, mas têm batido cabeça nas ruas, na verdade, é pela continuidade da corrupção; já que muitos detentores de mandato eletivo e outros tantos operadores de esquemas lesivos ao País que apoiam a tigrada solta nas avenidas e praças estão envolvidos até a cabeça nesse esquema ora investigado pela Lava-Jato e em outros tantos conluios inomináveis.


Primeiro a tragédia, depois a farsa

´A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa´, segundo o pensador e filosofo alemão Karl Marx. Esta consigna cai como uma luva para o atual momento político brasileiro.


O que também se configura como uma contradição histórica nacional é que o consórcio (político-empresarial-militar-midiático) que articulou e apoiou a golpe civil-militar de 1º de abril de 1964 é o mesmo que ora opera a articulação contra o governo, o PT e os demais setores da esquerda brasileira.


Há, agora, apenas um detalhe diferente: não precisarão das forças armadas que foram usadas contra o povo e suas organizações políticas e sociais para desferir-lhes o golpe em 1964. Por isso, o clamor dos ´patriotas´ de plantão, que por incultura política e desinformação histórica veem nos militares suas salvaguardas políticas e sociais. E ainda se confortam e se subordinam a uma ordem imposta, para salvar seus interesses políticos e econômicos, que imaginam estarem ameaçados.


O golpe civil-militar desferido contra a democracia e o povo brasileiro, em 1º de abril de 1964, foi a tragédia. O impeachment contra a presidente Dilma e um possível processo contra Lula de modo a impedir-lhe de disputar as eleições de 2018, será a farsa.


Assim, ao fim e ao cabo, o consórcio político-empresarial-judicial-midiático quer com isso não dar fim à corrupção, mas interromper um mandato presidencial conferido democraticamente pela maioria dos eleitores brasileiros. Obter por esse método golpista o que os brasileiros lhe negaram nas eleições de 2014. E, por fim, de quebra, inviabilizar ou impedir Lula de disputar as eleições de 2018. O projeto é demolir Lula e depois tentar demolir seu legado. As forças democráticas e os trabalhadores desse imenso País não podem permitir que isso aconteça.


(*) Jornalista e analista político









Últimas notícias

Notícias relacionadas



REDES SOCIAIS
Facebook Instagram

Sindicato dos Auxiliares de Administração Escolar em Estabelecimentos Particulares de Ensino no Distrito Federal

SCS Quadra 1, Bloco K, Edifício Denasa, Sala 1304,
Brasília-DF, CEP 71398-900 Telefone (61) 3034-8685
recp.saepdf@gmail.com